quarta-feira, 17 de fevereiro de 2016

Homófonas

A minha avó dizia amiúde que, com aquela idade, já só queria paz e sossego. Eu, sempre de resposta pronta, perguntei-lhe, do alto dos meus três anos, para que é que a avó queria pás, se já não brincava na areia. Ainda hoje se repete esta conversa, lá em casa. Está visto que as necessidades básicas de sobrevivência variam muito aos olhos de cada um.

Café sem manteiga

Até eu, que não sou nada de resoluções de ano novo, decidi começar este com uma alimentação assim pouco mais ou menos a imitar o saudável. Nada de mais, só uma tentativa de não fazer a refeição da asneira a todas as refeições. Gosto de cozinhar mas, a viver sozinha, às vezes a paciência para cozinhar só para mim não é muita, e acabo a comer atum ou cereais. Não sei onde é que vão buscar imaginação para pratos elaborados todos os dias, mas gostava de ser assim, juro. Os horários manhosos também não ajudam. E pior do que as refeições, é fora delas. Já percebi que o segredo é não ter açúcar, nas suas mais variadas formas, em casa. É que além de cozinhar, acontece que gosto muito de comer. Longe vão os dias em que as lágrimas me corriam cara abaixo enquanto mastigava os brócolos, sob o olhar atento da mãe. De resto, a casa dela continua a ser uma excepção a qualquer vidinha regrada que se queira levar. Mas no resto dos dias ando a ver se me porto bem, se deixo comida feita de véspera, se faço mais sopa, se como mais salada, mais peixe, se não salto refeições, se levo lanches de jeito para o trabalho e não faço jejuns de sete horas, se não viro diabética tão cedo. Não ando a passar fome, zerinhos, nem ando nisto para perder peso (se não desapareço). Dois dias num regime desses e já não sabia dizer quanto são dois vezes três. Resumindo, é uma tentativa de um projecto a longo termo. Não acredito em dietas, num dia come-se tudo, no dia seguinte acabou-se o arroz, a massa, as batatas, o pão, o açúcar, as bebidas com gás, os doces. Chega o dia da asneira e marcham pizzas, gelados, crepes com Nutella, antes que chegue a meia-noite e os verdes voltem a atacar... Juízo, sim?

Ainda não são horas

Quando pedes um café e te perguntam se queres com manteiga.

terça-feira, 9 de fevereiro de 2016

nov-idades

Escrevo com a gata ao colo. Ultimamente o trabalho, o mestrado, cada um deles parece um gato espojado no meu colo, a bloquear-me os movimentos. Tenho medo de me tornar um bicho trabalhador que conhece fórmulas químicas cabeludas mas não sabe por quanto é que ganharam o Marcelo e o Benfica. Estou fluente na linguagem do não, não posso ir hoje, não tenho folgas, não sei o que é feito deles, não sei onde estava com a cabeça. Gabam-me uma coragem e uma motivação que eu não sei onde meti se alguma vez tive. E pensar que houve um tempo em que ser estudante a tempo inteiro me parecia uma ocupação do caraças, ou quando conjugar trabalho e ginásio já era uma trabalheira. A minha gata tem crises de ansiedade. Foi tirada da rua e nunca se habituou a 100% à nova vida de sofá. O nosso problema com os animais, e também com as pessoas, é achar que estão sempre melhor connosco. Nem sempre isso é verdade. Para nós, um gato na rua é um gato em sofrimento, seria tão mais feliz lá em casa se lhe enfiássemos lacinhos na cabeça e ração de marca no bucho. Mas não, e isso resume-se ao simples facto de que eles não vivem pelos nossos padrões. As pessoas deviam perder mais tempo a pensar nestas coisas e menos tempo inquietas com ninharias. No domingo à tarde uma pessoa conhecida mas não a esse ponto viu-me de camisola de capuz, leggings e sapatilhas, e chegou-se à minha beira a perguntar se tinha ido correr. Porque é assim que mandam as leis que nunca me foram apresentadas, se te vestes de certa maneira é bom que ajas em conformidade. Vou apresenta-la à outra que me disse que devia criar um blogue de moda, sem desconfiar sequer que ando nestas lides. Já dizia o outro que as opiniões são mesmo assim. Mas falávamos de animais. A minha paciência está por um fio no que concerne a aturar tipos bêbados que nem um cacho que vêm esmurrar a porta da farmácia às 3h e meia da manhã, a chamar-me filha desta e mãe da outra porque não vendo zolpidem sem receita médica. Também quero trabalhar 35h por semana. Noto agora que a palavra sapatilhas me sai da boca sem me aperceber, já lá vai o tempo em que estranhava as expressões destas bandas. Às vezes tenho a certeza que sim, vive-se bem é nesta terra onde se usam sapatilhas e se ri de quem diz "à beira de". Depois percorro uns quantos (umas vezes parecem mais, outras menos) quilómetros e percebo que não, o sítio ideal para chamar casa é outro, a casa onde o meu sobrinho trepa ao muro para me dizer adeus e mandar beijos com a mão enquanto o carro se afasta, e me deixa de coração apertado a pensar que raio estou a fazer da vida. Na minha cabeça, faz tudo parte do caminho, e diz-se que todos eles vão dar a Roma. Não me parece mal.